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Parte II
I - "Quem é esta? O que faz aqui?"*
O roubo da espada de Gryffindor havia deixado Severus preocupado. Afinal, Tom Riddle cobiçara durante muito tempo aquela espada para transformá-la em seu Horcrux. Se a espada fora roubada por algum outro Bruxo das Trevas querendo usar a sua simbologia para arregimentar seguidores, seria uma volta ao pesadelo que todos acreditavam haver-se encerrado. Como se isso não bastante, o roubo era uma desmoralização para Hogwarts e os aliados da Ordem da Fênix, e o Ministério aproveitara para intervir em Hogwarts outra vez. Severus estava certo de que eles o faziam de propósito, para impor sua autoridade. Como na época de Dumbledore, o Ministério temia que os dirigentes da escola se transformassem em um poder paralelo ao deles. Agora estavam acusando Minerva do roubo, o que deixava Severus especialmente irritado. Durante os primeiros dois dias que se seguiram ao roubo, Severus efetuou uma investigação pessoal. Conversou com Harry, com os alunos de Slytherin e com vários professores para tentar obter um quadro geral da situação. Estava certo de que alguém usara Poção Polissuco para se disfarçar como Minerva. O fato de Slughorn ter decidido preparar a poção para seus alunos de sétimo ano lhe parecia suspeito, assim como o modo negligente como deixara um caldeirão cheio com a poção na sala de aula durante vários dias. No entanto, o longo tempo necessário para a preparação da poção e a necessidade de explicar detalhes a respeito de sua composição justificavam, em parte, essas ações, assim como era inegável que essa era uma das poções que mais caía nos exames de NIEMs. Na tarde do segundo dia após o roubo, depois de sua última aula do dia, Severus retirou-se a seus aposentos e tomou um longo banho para relaxar. Harry ainda tinha mais uma aula e só voltaria dali a uma hora. Ao sair do banho, Severus foi para seu escritório dar de comer a Ceci. Em geral era Harry quem cuidava da jibóia, já que os dois podiam conversar em Parselíngua e se entendiam muito bem, mas Severus gostava da companhia de Ceci, e dar-lhe de comer era uma boa desculpa para ficar com ela. Severus sentou-se no sofá enquanto Ceci comia sua ração. Um movimento sobre a superfície de seu espelho de cristalomancia** atraiu-lhe, contudo, a atenção. Severus se levantou e se aproximou do espelho para ver melhor. Uma bruxa que Severus reconheceu como Minerva, vestida de negro, flutuava sobre algo que parecia ser um tapete voador, vindo do castelo de Hogwarts, na direção do lago. Quando a imagem ficou mais nítida, Severus viu que não era um tapete, e sim uma tapeçaria. A bruxa pousou ao lado de um bote. Severus pôde ver, então, que a tapeçaria retratava a Dama de Shalott tecendo em seu tear, e que a bruxa carregava sob o braço uma caixa de vidro contendo uma espada. A pseudo-Minerva aproximou-se do bote, largou a caixa em seu fundo e entrou dentro dele. Era um bote mágico: sem que fosse preciso remar, ele começou a deslizar pelas águas. A imagem nublou-se, tornando-se indistinta, e logo a superfície do espelho se tornou inerte outra vez. Severus andou de um lado para o outro pelo escritório. Pensou
em deixar um bilhete a Harry, mas não achou necessário,
já que voltaria logo. Saiu de seu quarto, subiu as escadas rapidamente
e dirigiu-se à porta da frente do castelo. Um Auror que estava
vigiando a porta lhe perguntou aonde ia. Ele disse que ia dar um passeio
à beira do lago e observar os pássaros. O Auror insistiu
em revistá-lo. Severus teve de se conter para não lançar-lhe
um Imperdoável. Assim que o Auror o liberou, Severus desceu até
a pequena praia entre as pedras e viu um bote junto à margem, como
vira no espelho. Aproximou-se. O bote estava vazio. Severus sentou-se
sobre uma das pedras e ficou olhando para o lago, sentindo-se frustrado. Harry o havia seguido até o lago, provavelmente tendo saído da aula e captado a localização de Severus por meio do elo que havia entre eles. A presença de Harry fez com que ele se sentisse melhor. O fato de que não podia guardar segredos de Harry, o que a princípio lhe parecera um fardo assustador, se revelara uma bênção. Assim, Severus sempre tinha alguém com quem compartilhar seus problemas e não se sentia sozinho. Enquanto caminhavam às margens do lago, sob a vigilância não tão distante de um Auror, Severus contou a Harry em detalhes o que vira no espelho de cristalomancia. Harry conseguia ler seus sentimentos e, de certa forma, pensamentos, mas nem sempre de uma forma tão clara e detalhada como quando esses pensamentos eram expressos em palavras. - Você acha que o espelho lhe mostrou o que realmente aconteceu? - Como você bem sabe, eu não acreditava no poder desse espelho. Mas ele tem me surpreendido, e tudo o que ele nos mostrou até agora tinha uma base real. - É verdade - concordou Harry, pensativo. - Mas você não acha que foi realmente McGonagall, acha? - Claro que não. Foi alguém usando Polissuco. - Severus, por que não voltamos para o escritório, chamamos Remus e Sirius e contamos a eles? Quatro cabeças pensam melhor do que duas! Severus gostaria de ter mais certeza sobre o significado do que havia visto antes de incluir o maluco do Black em suas reflexões. Mas conhecia Harry e sabia que ele não iria parar de atormentá-lo até que chamassem Black e Lupin para compartilhar o novo mistério com eles. Assim como antes Harry dividia tudo com Hermione e Ron, agora as novas aventuras de Harry eram sempre compartilhadas com Severus, Remus e Sirius - um estranho quarteto que se formara do modo mais improvável possível. - Tudo bem, Harry. Mas quero que me prometa que isso vai ficar entre nós quatro. Não quero que essa história se espalhe. - Hmpf. O que você quer dizer é que não posso contar nem a Ron nem a Hermione. - Isso mesmo - confirmou Severus. - Está bem - grunhiu Harry, contra a vontade.
Com Black e Lupin sentados no sofá de seu escritório e Harry e Severus em poltronas avulsas, Severus relatou-lhes o que vira em seu espelho. Lupin escutava atentamente. Black brincava com Ceci, que era apaixonada por ele e estava agora enrolada em seu pescoço e braços. - Bem que esse seu espelho poderia ter mostrado o resto da história, também - reclamou Black, quando Severus terminou seu relato. - Quatro muralhas cinzentas e quatro torres cinzentas... - recitou Lupin, lembrando-se dos versos de A Dama de Shalott, de Tennyson. - Alguém se lembra se existe alguma tapeçaria da Dama de Shalott em Hogwarts? Ninguém se lembrava de ter visto tal tapeçaria. - Tem centenas de tapeçarias em Hogwarts - resmungou Harry. - Vou vistoriar o castelo para ver se encontro uma tapeçaria com essas características - disse Severus. - Não que vá adiantar muito encontrá-la. - Há algo que não entendo - disse Lupin. - Por que o criminoso deixou a tapeçaria em troca do bote? - Não deve ser fácil manobrar uma tapeçaria. Nenhum de nós aprende a manobrar tapetes, porque tapetes voadores são proibidos pelo Ministério - observou Sirius. - Uma coisa é descer do castelo até o solo em uma tapeçaria; outra é manobrar uma tapeçaria por entre as árvores, por exemplo. - Também é proibido enfeitiçar tapeçarias? - perguntou Harry. Ninguém sabia dizer. - Essas regras do Ministério são um absurdo. Essa de proibir tapetes voadores, por exemplo, deve ser baseada em interesses políticos ou econômicos - disse Sirius, fazendo uma careta. - Gostaria de voltar à nossa Dama de Shalott - disse Lupin. - Até onde terá ela ido, depois que partiu no bote? Terá ido até os portões de Hogwarts e passado a espada para um cúmplice? Ou terá deixado Hogwarts? - Certamente não saiu de Hogwarts, já que não está faltando ninguém em Hogwarts - raciocinou Severus. - De qualquer forma, dificilmente qualquer uma dessas possibilidades poderia ter ocorrido. Os portões estavam bem fechados, e havia proteções ao redor de todo o castelo. Não digo que seja impossível passar um objeto pelos portões sem ativar nossas proteções, mas, com certeza, Filius, Minerva e eu fizemos o possível para tornar isso bastante difícil. - Não sei quanto a vocês - disse Lupin -, mas acho que não temos elementos suficientes para chegarmos a uma conclusão. Isso não é, no entanto, razão para não agirmos. - Quer ser mais claro, Lupin? - disse Severus, impaciente. - Só se você me chamar de Remus. Severus olhou para o teto. - Como queira, Remus - disse Severus, em voz aveludada. - Como podemos agir se não sabemos quem é o culpado? - Veja, se o que você nos relatou é verídico... e eu acredito que seja... nós sabemos detalhes sobre o modo como o culpado agiu. E o culpado não sabe que nós sabemos - concluiu Lupin, como se aquilo explicasse alguma coisa. Severus franziu o cenho. - Isso poderia ser muito útil se quiséssemos chantagear o culpado, mas não vejo como... - Ah! - exclamou Black. - Acho que estou começando a entender. - Que bom - disse Harry -, porque eu não estou entendendo nada. - Eu estou apenas especulando, amigos - disse Remus. - Não tenho nenhum plano concreto. Só estou observando que temos essa vantagem sobre nosso oponente. - Até onde sabemos, essa pessoa agiu sozinha, pelo menos aqui dentro de Hogwarts. É difícil dizer, porque as imagens não eram claras, mas ela me passou a impressão de não ser uma pessoa segura como Minerva. Os gestos dela eram nervosos. Nós poderíamos tentar intimidá-la - sugeriu Severus. - Sim! - disse Black. - Você é bastante intimidador quando quer, Sevvie. Severus odiava aquele apelido, e lançou um olhar fulminante a Black. - Sobre a intimidação - disse Harry, claramente querendo impedir um acirramento da discussão -, vocês têm alguma idéia específica? - Nós sabemos que o criminoso usou a tapeçaria da Dama de Shalott. O poema de Tennyson é bastante conhecido no mundo mágico. Poderíamos usá-lo, evocando certas imagens... - sugeriu Black. Severus sentiu como se o mundo se iluminasse subitamente. Então recitou: - Ela deixou a tela, deixou o tear, - Oh, oh, oh! Severus, se você está pensando o mesmo que eu, é porque você é um gênio - exclamou Black. E assim começou a nascer o plano que iria ocupar o quarteto pelos próximos cinco dias...
II - Nenúfar
Uma questão que tornava tudo mais difícil era que ninguém estava autorizado a deixar Hogwarts - ou seja, todos os itens teriam de ser encontrados por ali mesmo. Severus dissera que precisaria de pelo menos quatro dias para aprontar o espelho - que seria o ápice do drama. Era natural, então, que optassem por uma encenação em cinco atos: um ato por dia. Estavam todos reunidos no escritório de Severus; Remus e Sirius haviam usado o sistema interno de Flu (que continuava ativo) para chegar lá. - Você revistou o castelo à procura da tapeçaria da Dama de Shalott, Severus? - perguntou Sirius. - Sim, revistei, e não, não a encontrei - respondeu Severus. - Vamos dar prosseguimento ao plano. - Eu estou preocupado com uma questão - disse Remus. - E se eles quiserem abafar as nossas "aparições" de objetos? A Comissão não vai querer divulgar o que acontece na Sala da Diretoria. - Ora - disse Harry -, se eles tentarem abafar, nós mesmos podemos deixar vazar. De um jeito sutil, é claro. - Muito Slytherin da sua parte - disse Severus, orgulhoso. - Eu acho que o mais seguro é cada um de nós deixar vazar o segredo a pelo menos uma pessoa ou "ser" todas as vezes - sugeriu Remus. - Não é só Hagrid que tem a língua solta. Temos Peeves, os fantasmas e os retratos. Harry poderia se encarregar de espalhar as informações, com cuidado, entre os alunos. Se todos nós sairmos dizendo que "todo mundo está comentando que aconteceu isso e aquilo", teremos certeza de que todo mundo estará realmente comentando. - Para o caso de eles quererem desaparecer com nossos objetos, podemos lançar um Feitiço Paralisador Permanente sobre eles - sugeriu Sirius. - Genial! - exclamou Remus. Sirius tirou do bolso um lindo nenúfar que havia "pescado" no lago quando o Auror que o estava vigiando se distraíra. Depositou-o sobre a cabeça de Remus. - Você está lindo, como Nefertum - comentou Sirius, lançando um olhar apaixonado a Remus. Severus olhou para o teto. - Vamos fazer o que precisa ser feito logo - resmungou. Remus beijou Sirius, depois olhou para Harry, que colocou a Capa de Invisibilidade sobre ele. Então Severus estendeu a mão com a ptyx*** e a depositou sobre a mão de Remus.
Em um piscar de olhos, Remus estava no escritório da Diretoria. O guarda, um Auror alto e forte, de ombros largos, estava imóvel junto a uma estante, perto da escrivaninha. Remus sabia que teria de ter cuidado. Contava com o fator surpresa e com a ptyx que agora estava no seu bolso. De forma não-verbal, aplicou um Feitiço de Levitação e, logo em seguida, um Feitiço Paralisador Permanente Não-Verbal. Não chegou nem a ver a reação do Auror atrás de si. Apenas escutou um murmúrio de surpresa enquanto levava a mão ao bolso e segurava a ptyx que o levaria de volta ao escritório de Severus.
III - Elmo
No quarto dia após o roubo, um pouco antes da meia-noite, Harry vestiu a Capa da Invisibilidade e saiu dos aposentos onde morava com Severus direto para as escadas, rumo à galeria de armaduras, no terceiro andar. Harry procurou uma armadura em estilo medieval. Talvez o seu lado gay estereotípico estivesse aflorando, pensou ele, não sem certa preocupação, mas então deu de ombros e atribuiu à influência de Sirius o fato de estar seriamente preocupado com o aspecto estético daquela aventura. Afinal, o tema era claramente romântico... Escolheu um elmo com uma linda pluma dourada. Guardou a pluma em um bolso de suas vestes, escondeu o elmo sob a capa e voltou para seu quarto. Repetindo pela milésima primeira vez suas mil e uma recomendações, Severus comprimiu-o contra a parede e lhe deu um daqueles beijos que o deixavam todo derretido. Harry teve de tomar fôlego antes de vestir de novo a Capa da Invisibilidade. Severus depositou a ptyx em suas mãos, e Harry foi catapultado direto ao escritório da Diretoria. Havia dois Aurors lá dentro. Harry sabia que não poderia cometer nenhum erro. Remus, no dia anterior, contara com o fator surpresa, mas agora o castelo todo estava comentando a respeito do nenúfar, graças às informações que eles próprios haviam começado a espalhar, e a vigilância estava alerta. Harry planejou com cuidado seus movimentos antes de lançar um Feitiço de Levitação junto com um Feitiço Paralisador Permanente, tudo de forma não verbal. Harry deixou o elmo flutuando nos ares e pegou a ptyx. Ainda viu o Auror lançar-se em sua direção, às cegas, e ficou feliz ao abrir os olhos e ver Severus diante de si. O coração de Harry estava disparado. Severus o abraçou mesmo sem vê-lo. A conexão entre eles era tão forte que Severus sempre sabia onde ele estava, mesmo com a Capa. - Alguém viu você? - sussurrou Severus. - Acho que não. Ufa. - Venha para a cama. Já é tarde.
IV - Pluma
No início da tarde do quinto dia, dez minutos antes de as aulas do período vespertino começarem, Severus chamou Draco a seu escritório. - Draco, o que os alunos andam comentando sobre o que está ocorrendo no castelo? - Ah, está uma confusão danada. As teorias mais destrambelhadas. - Você ouviu alguma coisa que tenha lhe chamado a atenção? Draco ficou pensativo. - Teve uma coisa. Ontem à noite, no meio da aula de Astronomia, a professora Wyrd entrou na sala da professora Sinistra e começou a insinuar que tinha visto ela descer da Torre da Astronomia na noite do roubo, e que ela devia tomar cuidado. A professora Sinistra ficou possessa e a empurrou para fora da sala, dizendo que a professora Wyrd é que entrara na Torre de Astronomia naquela noite sem pedir licença e que não fora a primeira vez, já que ela costumava ir lá com seu namorado. A professora Sinistra disse que, da próxima vez que a visse com seu namorado na Torre de Astronomia, falaria com a Diretora. Severus não pôde conter o riso irônico. - E quem os boatos dizem ser esse... namorado? - Ora, o professor Fence, quem mais? Severus balançou a cabeça. Era só o que faltava, agora. Intrigas amorosas no castelo. Wyrd e Sinistra brigando por Fence, provavelmente. Mas... haveria mais alguma coisa além disso? - Eu lhe contei o que sabia - disse Draco. - Agora é a sua vez. Afinal, o que está acontecendo nesse castelo? Severus preparou-se para fazer a sua parte na tarefa de "vazar" a informação do dia. Sabia que não seria nada sutil, mas não tinha importância. Assim que os boatos começavam a se espalhar, ninguém sabia dizer como haviam começado - ou, no mínimo, as fontes se tornavam confusas. - E você acha que eu sei? Hoje todos estão dizendo que apareceu um elmo na Sala da Diretoria. Primeiro um nenúfar, agora um elmo. A Comissão de Investigação está tão perdida como se estivessem sob um Feitiço Confundus. Parece que as coisas simplesmente surgem na Sala da Diretoria e que ninguém consegue tirá-las de lá. - Vendo Draco arregalar os olhos. Severus achou que era o bastante. - Agora vamos. Está na hora da aula. À noite, Severus foi o encarregado de levar a pluma dourada para a Sala da Diretoria. Era uma tarefa bem mais fácil do que a dos demais, porque a pluma era um objeto pequeno, mas coubera a Severus porque Severus teria de levar ainda um outro objeto, além de desempenhar um papel mais complexo na última parte do plano. Como Severus sabia ser discreto quando queria, nenhum dos dois Aurors notou de imediato que a pluma se juntara ao elmo. Não teve nem graça, de tão fácil que foi cumprir aquela tarefa.
V - Tapeçaria
Desde o início do plano, Sirius foi destacado para confeccionar a tapeçaria e levá-la à Sala da Diretoria. Como Sirius não soubesse onde encontrar fios e tela dentro do castelo, achou que o mais fácil seria encontrar uma tapeçaria em Hogwarts para usar como base. Queria uma tapeçaria com várias cores e versátil, que lhe possibilitasse a execução de variações. No sétimo andar, achou exatamente o que queria. Havia sinais de traças em seus fios, mas era uma tapeçaria animada! Tinha de ser ela. Na mesma noite em que Severus iria colocar a pluma na Sala da Diretoria, Sirius, após o toque de recolher, voltou ao sétimo andar. Olhou em torno - não havia ninguém no corredor. Sacou de sua varinha, transfigurou a tapeçaria em um anel e a colocou no dedo. Remus o recebeu de volta ao quarto com uma expressão de curiosidade. - Pegou? - Peguei! - respondeu Sirius. - Ninguém viu você? - Creio que não. - Que tapeçaria você escolheu? - perguntou Remus. -A dos trolls dançarinos. Remus arregalou os olhos, mas não disse nada. Sirius pegou o espelho para se comunicar com Severus.**** Este, contudo, não ficou nada feliz ao saber da escolha de Sirius. - Você enlouqueceu? Essa tapeçaria, além de animada, é das mais chamativas do castelo! Corremos o risco de que alguém note a sua ausência e reclame imediatamente. Sirius balançou a cabeça. - Severus, Severus. Os alunos vão nos amar por termos sumido com aquela tapeçaria. Aquilo era indecente. Precisamos pensar na nossa popularidade, depois que nossos atos vierem a público! Severus fuzilou-o com os olhos. Mesmo através do espelho, o olhar dele parecia feito de fogo negro. - Nem pense em danificar a tapeçaria. É patrimônio de Hogwarts. Sirius suspirou. - Tudo bem: vou só rearranjar a sua disposição, para formar outras imagens, mas as imagens anteriores poderão ser facilmente recuperadas depois. Já que você faz questão dos seus trolls de tutu... - Como você é o único desocupado do grupo, terá tempo de sobra para fazer um bom trabalho - observou Severus, com seu sarcasmo habitual. - Não me chame de desocupado. Lembre-se de que um dos motivos pelos quais estou escrevendo a nossa história é para que a posteridade se lembre da sua ingratidão sebosa. Mas não se preocupe. Eu já sabia que, devido às minhas qualidades artísticas, seria o escolhido para essa tarefa - Sirius empinou o queixo. - Mesmo que eu tenha de passar a noite acordado, prometo que amanhã à noite ela estará pronta. Claro que terei de aplicar um Feitiço de Animação Dormente, para ser ativado depois, mas quando ele for ativado... será magnífico. - Black, não seja idiota. Você precisa descansar para estar plenamente lúcido amanhã. Não é possível que você seja tão incompetente que não consiga terminar essa tapeçaria amanhã. Use um Feitiço Tricotador. Lupin, leve-o para a cama já. - Ora, quem diria que... Severus deu-lhe as costas no espelho e o deixou falando sozinho. Sirius ergueu a sobrancelha para Remus. - Ele mandou a gente para a cama. - Eu sei que você não gosta de obedecer às ordens dele, mas esta me parece bastante... como dizer... - Sedutora - disse Sirius, empurrando seu parceiro para a cama.
Na noite seguinte, depois da meia-noite, eles se reuniram novamente no escritório de Severus. Sirius vibrou quando Severus não pôde conter um olhar de admiração ao analisar o trabalho de Sirius na tapeçaria. Ele adorava surpreender a Severus. A tapeçaria mostrava apenas um lago com um bote flutuando sob os salgueiros da margem, mas Severus com certeza pressentira os feitiços ocultos que desencadeariam a animação. Harry cobriu Sirius com sua Capa de Invisibilidade. Remus procurou os lábios de Sirius meio às cegas; Sirius ajudou-o, virando-se para ele para receber o beijo de boa sorte. Finalmente, Sirius colocou a mão para fora da Capa e Severus depositou a ptyx sobre ela. Quando Sirius se viu na Sala da Diretoria, viu também que, além dos dois Aurors, o próprio Nulligan estava guardando o local - sentado à antiga escrivaninha de Minerva. A situação exigia uma pequena adaptação de planos. Sob a Capa da Invisibilidade, Sirius pegou a varinha e fez levitar um dos misteriosos objetos sobre a estante atrás da escrivaninha. Nulligan se levantou de imediato e os outros dois Aurors se precipitaram para aquele lado. Enquanto isso, Sirius, com toda a agilidade e rapidez de que era capaz, retirou a tapeçaria de baixo da Capa e pregou-a à parede com um Feitiço Adesivo Permanente Não-Verbal. Depois levou a mão ao bolso e apertou a ptyx.
Há quatro dias Severus vinha trabalhando, em seus poucos horários
de folga, no espelho. Estava usando o seu espelho comum de banheiro. Não
quisera usar o espelho de cristalomancia - apesar de imprevisível,
o espelho se revelara, até certo ponto, útil. Agora, depois
de um domingo inteiro trabalhando nele, o espelho estava pronto para cumprir
sua importante tarefa. - Apenas quatro. Mas são feitiços complexos e interligados. Um deles fará as dimensões do espelho aumentarem; o segundo fará com que ele rache na diagonal. Ligado a esse efeito da rachadura, eu acoplei um feitiço amplificador de som. O quarto feitiço é um retardador, para que tudo só comece a acontecer na hora certa. - Severus olhou em volta do escritório. - Black já devolveu a sua Capa? - Devolveu. Ele reclamou bastante. Disse que teve de passar mais de uma hora junto à gárgula da entrada da Sala da Diretoria para descobrir a nova senha. - Mas descobriu ou não? - Descobriu. A senha é "losango". - Losango? Por que será que escolheram essa senha? - Eles também eram quatro quando chegaram aqui - respondeu Harry. - Ah. Os imbecis da Comissão de Investigação. - Estou me concentrando para a tarefa a cumprir. Harry aproximou-se e o abraçou. - Eu sei. Severus retribuiu-lhe o abraço. Harry aproveitou para massagear-lhe os músculos tensos. Por alguns instantes, Severus relaxou e entregou-se ao toque firme das mãos de Harry. Antes de preparar-se para sair, Severus serviu-se de uma dose de absinto. Harry o encarou com um ar assustado. Severus tentou tranqüilizá-lo. - É só uma dose bem pequena. Vai dar exatamente o impulso de que eu preciso. Harry sorriu. - Não se preocupe, Severus. Vai dar tudo certo. O sorriso de Harry iluminava-lhe a alma. Severus acreditou mesmo que tudo iria dar certo. Vestiu a capa, arrumou o espelho dentro dela e tomou a ptyx na mão. Viu-se em meio a uma sala lotada de Aurors. Por sorte não esbarrara em nenhum deles ao chegar. Mas não importava quantos Aurors estivessem ali dentro. Severus lançou um Impedimenta Não-Verbal sobre todos. Enquanto todos tinham seus movimentos paralisados, Severus, com o máximo cuidado para não ser visto, pendurou o espelho diante da estante que ficava atrás da escrivaninha, formando um ângulo de noventa graus com a tapeçaria. Estava tudo preparado. Severus segurou novamente a ptyx e voltou a seu quarto. Severus estava tirando a Capa de Invisibilidade, sob o olhar curioso de Harry, quando um barulho medonho ecoou por todo o castelo, balançando as suas estruturas. - Vamos, Harry. O espelho se partiu. Não temos tempo a perder.
Notas:
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Ptyx, Março / 2007
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