Capítulo IX - O Medalhão



Severus acordou de um sonho muito vívido em que Harry... Pelas barbas de Slytherin. Severus pronunciou um feitiço de limpeza às pressas. Em seu sonho, Harry se masturbava, mas era como se estivesse masturbando a Severus, a mão quente e ágil do garoto subindo e descendo pelo seu pênis, o polegar roçando-lhe a veia mais sensível e espalhando as primeiras gotas de sêmen pela ponta... Ao se lembrar do sonho, Severus quase teve outra ereção. Isso só não aconteceu porque logo a curiosidade intelectual se sobrepôs ao desejo sexual fadado a não ser satisfeito: será que Harry havia tido o mesmo sonho? Será que isso estava acontecendo por causa da afinidade mágica entre eles? Será que, de alguma forma, sempre que Harry se masturbasse, mesmo a mais de cinco metros de distância como estavam, e com uma porta os separando, ele sentiria? Se isso estava acontecendo, seria um pesadelo.

Lupin abriu a porta da cozinha, despertando-o de suas conjecturas, e Severus foi para o banheiro.

Meia hora depois, todos estavam tomando café da manhã na sala e discutindo o que fazer em relação ao medalhão de Slytherin. Havia, surpreendentemente, um consenso de que o próximo passo deveria ser interrogar Kreacher.

Harry quis entender por que Kreacher obedecia a ele se Black estava vivo. Black explicou que, antes de ir para o Departamento de Mistérios no dia de sua pseudomorte, deixara um testamento mágico legando a casa e Kreacher a Harry, e que, a partir do momento em que o Ministério aprovara o testamento, este fazia com que Kreacher estivesse subordinado a Harry.

- Basta você chamar o nome dele que ele aparecerá onde você quiser - disse Black.

- Então por que não o chamamos aqui? - perguntou Harry.

- Aqui, exatamente, não seria uma boa idéia, porque ele não deve ver Sirius nem Severus - respondeu Lupin. - Mas você poderia ir para o alpendre e interrogá-lo lá.

- Por que não fizemos isso antes, se era tão fácil? - perguntou-se Severus em voz alta.

- Porque estávamos ocupados recuperando anéis de Slytherin, matando dragões e procurando esplumeors. - Black deu de ombros. - Eu sei, Snape, nós passamos uma semana trancados aqui lendo livros. Mas eram as ordens de Dumbledore, não eram?

Severus ficou sem ter nada de arrasador para replicar, porque era verdade.

- Por falar em Dumbledore - disse Lupin, levantando-se -, espero que não precisem de mim para essa tarefa, porque preciso passar o dia com os lobisomens. Como vocês bem sabem, ontem não pude nem aparecer por lá.

- Não tem problema, Remus - respondeu Black. - Snape e eu daremos cobertura a Harry.

Severus arqueou uma sobrancelha. Vinda da boca de Black, a expressão "Snape e eu" era uma das mais exóticas que já havia escutado.

Depois que retiraram a mesa, Lupin deu um beijo em Black, despediu-se com um aceno de Severus e Harry, e saiu.

- Vou para o alpendre, então - disse Harry, olhando para Severus e Black.

Severus assentiu com a cabeça; Harry seguiu para os fundos da casa.

- Escute, Snape... - disse Black, pensativo. - Eu tenho uma idéia. Espere aqui.

Severus, que estava pensando em ir atrás de Harry e ver se havia algum modo de escutar a conversa dentro do alpendre, sentiu-se um tanto contrariado, mas esperou enquanto Black subia as escadas de três em três degraus.

Em menos de um minuto, Black apareceu de volta, voando escada abaixo com um par de Orelhas Extensíveis.

- Você andou passando pela Gemialidades Weasley?

- Não. Roubei uma dessas dos gêmeos em Grimmauld Place, e eu mesmo construí a outra, seguindo o modelo.

Black entregou-lhe um dos fios e seguiu para os fundos da casa. Severus seguiu atrás dele. Black parou diante da porta do alpendre e colocou a ponta da corda no ouvido. Severus aproximou-se da porta e o imitou.

As cordas cor de carne se contorceram como longas minhocas e deslizaram por baixo da porta.

Severus escutou a voz do elfo-doméstico com nitidez:

- ... levou Kreacher até a caverna. O jovem Mestre precisou fazer um corte no dedo porque a caverna não deixava ninguém entrar sem um sacrifício de sangue. Então o jovem Mestre ajudou Kreacher a entrar em um bote oculto dentro da caverna, e o bote levou o jovem Mestre e Kreacher pelo lago gelado até uma pequena ilha onde havia uma espécie de bacia. Kreacher não quer contar essa história para o pirralho, mas o pirralho agora é Mestre de Kreacher, então Kreacher...

- Kreacher, continue. O que Regulus fez então? - perguntou Harry, com impaciência.

Regulus? Severus olhou para Black, que parecia ainda mais surpreso do que ele mesmo. Kreacher suspirou.

- Kreacher tem de fazer o que o Mestre manda... Kreacher tem de contar a ele que o jovem Mestre fez Kreacher tomar o líquido da bacia com uma taça. O medalhão estava no fundo da bacia. O jovem Mestre pôs o medalhão no bolso e trocou-o por um outro. A bacia se encheu de novo com a poção. Então o jovem Mestre levou Kreacher de volta ao barco e para fora da caverna.

- E o que aconteceu com o medalhão?

- Mestre deu para Kreacher levar para casa. Kreacher nunca mais viu o jovem Mestre. Um bom Mestre. Nunca desapontou Madame, como o sujo do irmão dele...

- Basta, Kreacher. Onde está o medalhão agora?

- Os traidores nojentos, amigos dos Muggles, estavam lá, destruindo tudo na casa de minha querida dona. Eles iam jogar a preciosa jóia no lixo. Kreacher levou-a para Madame Malfoy.

- Isso foi quando estávamos fazendo a limpeza em Grimmauld Place? Você levou o medalhão para Narcissa? Por quê?

- Kreacher precisava obedecer ao Mestre Sirius Black, assim como agora precisa obedecer a Harry Potter, mas Kreacher preferiria mil vezes servir à família Malfoy. Madame Malfoy lembra a Kreacher a sua dona, em sua nobreza e em suas maneiras.

Severus sentiu o coração apertado. As coisas estavam ganhando uma estranha configuração, e ele, Severus, teria de agir. Não sabia ainda exatamente como. Sabia, no entanto, que teria de usar Oclumência para que Harry não desconfiasse do rumo que seus pensamentos estavam tomando, e que isso seria muito difícil. Era melhor que nem esperasse Harry sair dali de dentro. Mas já era tarde demais. Escutou Harry mandando Kreacher de volta a Hogwarts, e logo Harry abriu a porta.

- Ah, vocês estão aí... Orelhas Extensíveis, hein? Quer dizer que eu nem preciso lhes contar nada.

Severus entrou de imediato no alpendre, abriu seu baú e começou a escolher suas armas. Distribuiu várias poções estratégicas pelos bolsos e forros ocultos em suas vestes. Precisava ter vários planos alternativos em mente, para utilizá-los conforme as circunstâncias. Aquele era exatamente o tipo de cenário que Severus mais odiava: quando tudo podia acontecer e ele precisava estar preparado para tudo.

Harry estava fitando-o com preocupação.

- Harry, eu vou a Grimmauld Place conversar com Dumbledore, e talvez nem volte para cá essa noite.

- Severus?

- Não se preocupe - disse Severus, e aparatou.

~*~*~

Dumbledore o recebeu no sótão - um quarto atulhado com a parafernália de instrumentos que o Diretor levara de Hogwarts para Grimmauld Place. Alguns retratos - entre eles o de Phineas Nigellus - davam vida às paredes nuas.

Severus sentou-se em uma poltrona enquanto Dumbledore ocupava o banco junto à janelinha.

- Então, Severus, a que devo o prazer de sua visita?

Severus contou-lhe o que Harry arrancara de Kreacher. Os olhos do velho mago brilharam intensamente.

- Então Regulus traiu Riddle!

- Regulus? - O nome de seu descendente fez com que Phineas despertasse. - Eu bem que desconfiava...

- Regulus deve ter descoberto sobre essa Horcrux e resolveu destruí-la... - Albus meneou a cabeça, pensativo. - Talvez estivesse espionando Riddle há algum tempo. Essa poção que Kreacher tomou provavelmente teria efeitos bem desagradáveis sobre um mago. Regulus foi esperto em levar Kreacher. Pobre elfo... Quem sabe não foi essa poção que deixou Kreacher um tanto... desequilibrado?

- É possível. Ah! Eu me lembro: Nefaserum. Uma poção que faz a pessoa reviver todas as suas culpas.

- Foi você que preparou?

Severus baixou a cabeça.

- Mais um item na lista dos meus crimes.

- Severus, nós já discutimos isso várias vezes. Não adianta olharmos para trás. Você percebe que esses fatos que agora descobrimos mudam tudo? Você percebe as potencialidades desse cenário, diante do que você me contou a semana passada, sobre a incumbência que Riddle transmitiu a Draco?

-Parece-me uma grande coincidência que esses dois fatos apontem para a família Malfoy. Eu não acredito em coincidências, nem em destino.

- Um Slytherin genuíno - disse Phineas, em aprovação.

- No entanto, parece que o destino está conspirando a nosso favor - replicou Albus.

- Você e seu otimismo Gryffindor. Por que diz isso, Albus? - perguntou Severus.

- Temos em nossas mãos a possibilidade de conseguirmos ao mesmo tempo a quinta Horcrux e a salvação de Draco Malfoy.

- E como faríamos isso? - perguntou Severus.

- Você vai procurar Narcissa a pretexto de propor um pacto pela segurança de Draco. Creio que você é suficientemente criativo para encontrar um modo de localizar o medalhão e sair de lá com ele.

- Eu achei que você fosse propor isso. Mas é muito arriscado. E se Narcissa se mostrar fiel ao Lord das Trevas?

- Você conhece Narcissa melhor do que eu. Não lhe parece que o que ela preza, acima de tudo, é sua família?

- É verdade. Mas como poderemos garantir a segurança de Draco sem levantar as suspeitas do Lord das Trevas?

- Realmente, não é simples. Quem sabe... fazendo com que Riddle pense que você está utilizando Draco Malfoy como um cavalo de Tróia?

- Às vezes você é mais Slytherin do que qualquer membro de minha casa poderia ser - observou Phineas.

- Phineas, esta conversa que estou tendo com Severus é muito séria. Por que não vai conversar com seus colegas em Hogwarts?

Phineas resmungou alguma coisa e retirou-se da moldura.

Só então Severus falou:

- Vamos ver se entendi: eu digo a Narcissa que você está disposto a proteger Draco, se Draco vier até você, e que, desta forma, Draco terá a possibilidade de matá-lo.

- Perfeito.

- O primeiro problema que vejo nisso, e que não é o mais grave, é que o Lord das Trevas não pretendia, realmente, que Draco cumprisse a missão.

- Você acredita mesmo nisso? - perguntou Dumbledore.

- Passou-me pela cabeça que, na verdade, ele estivesse me testando.

- Pois eu acho que isso é muito provável. Acho que ele ficará encantado se souber que você encontrou um modo de transformar Draco em um cavalo de Tróia.

- É aí que entra o segundo problema que vejo nessa sua idéia. O que iremos fazer com Draco?

- Iremos usá-lo para montar uma armadilha para Riddle.

Severus estreitou os olhos para Dumbledore.

- É muito arriscado, tanto para ele como para você, e para todos nós!

- Meu tempo está se esgotando, Severus. Teremos o máximo cuidado, em cada movimento.

- Supondo que eu concorde com o seu plano... Como irei convencer Narcissa da sinceridade dos meus propósitos?

- Faça um Voto Perpétuo com ela.

- Albus... Isso é extremamente perigoso. E se ela exigir algo que eu não posso cumprir?

- O quê, por exemplo?

- Não sei. Que, se Draco falhar, eu mate você no lugar dele, por exemplo.

- É exatamente isso que espero que ela faça.

- Albus!

- Você sabe tanto quanto eu que eu tenho poucos dias de vida, Severus. Por que não jogarmos com isso?

- Você está levando isso longe demais. Talvez eu não queira mais fazer o seu jogo.

- É o melhor plano que temos para salvar Harry.

Severus suspirou.

- Então diga a Harry, por favor, que tive de ir para a minha casa resolver um problema urgente, e que passarei a noite lá.

Albus piscou para ele de modo irritante.

- Isso é verdade ou você está me pedindo que minta para acobertar atividades, digamos, extraconjugais?

Severus teve vontade de dar um soco em Albus, mas se controlou.

- Eu pretendo, realmente, ir dormir em Spinner's End. Mas não posso ter certeza, não é? Você mesmo me disse que o importante é conseguir a maldita Horcrux.

~*~*~

Severus chamou a mansão dos Malfoy em Wiltshire pelo sistema de Flu da lareira do quarto de Albus. O velho mago insistira que era seguro. Por sorte, Narcissa apareceu, e estava sozinha.

- Severus! Que coincidência! Eu queria muito falar com você.

- Você está bem, Narcissa?

- Estou preocupada. Gostaria que pudéssemos conversar.

- Posso ir aí agora? Você está sozinha?

- Não exatamente. Draco está no quarto dele, e os elfos-domésticos, por mais discretos que sejam, sempre são um aborrecimento. Mas aparate direto na minha suíte, em meia-hora, e poderemos conversar sem sermos perturbados.

- Como quiser. Vejo-a em meia-hora.

Mulheres. Ele estava pronto, mas teria de esperar meia hora.

Albus retornou com um sorriso nos lábios e uma caixinha nas mãos.

- Foi bom que ela lhe pedisse para esperar meia hora. Tive uma idéia.

~*~*~

Narcissa estava lindíssima, com um vestido verde-escuro que lhe ressaltava os cabelos loiros e a silhueta esguia. Assim que Severus chegou, ela foi cumprimentá-lo com um abraço e um beijo no rosto, como sempre fazia quando estavam a sós.

- Severus, que bom que você veio. Eu estava agoniada.

- Ele lhe contou, então.

- Sim. Creio que ele está fazendo isso para punir a Lucius, e me contou para que Lucius também seja informado.

- Provavelmente.

- Sente-se, Severus. Vou lhe trazer seu drinque favorito.

Sempre que ia visitar os Malfoys, Severus tomava Ogden's Old puro.

A suíte conjugal dos Malfoys consistia em um amplo quarto de dormir, um banheiro e a saleta com três poltronas e um bar, onde Severus aparatara. Narcissa trouxe-lhe o copo de Firewhisky, serviu um de vinho de elfos para si própria e sentou-se na poltrona situada obliquamente em relação à dele.

- Draco acha que é um grande privilégio para ele. Está todo vaidoso e agitado. Meu Deus, ele é tão criança!

- Eu sei. Eu também estou muito preocupado, e foi por isso mesmo que quis vir falar com você.

- Oh, Severus! Acha que há alguma forma de ajudar Draco?

Severus encarou-a com firmeza.

- Você sabe de minha fidelidade absoluta ao Lord das Trevas.

Uma expressão de desamparo estampou-se no rosto de Narcissa. Por um instante, Severus achou que ela fosse irromper em choro. Então o desespero se transformou em decisão em suas feições, e ela se levantou e ajoelhou-se junto à cadeira de Severus.

- Por favor, Severus. Eu sou capaz de qualquer coisa para proteger meu filho. Deve haver uma forma de salvar Draco.

Severus deveria estar preparado para aquilo, mas a verdade é que a cena o abalou. Narcissa apoiara as mãos sobre seu tórax, e ele as segurou entre as suas.

As lágrimas corriam pelo rosto de Narcissa.

- Meu filho... meu único filho!

- Se ele for bem sucedido, ele será honrado mais do que nenhum outro.

- Ele não vai ser bem-sucedido! - Narcissa soluçou. - Como poderia? Se o próprio Lord das Trevas não conseguiu... - Ela se conteve, e o encarou com um brilho de pânico nos olhos. - Severus, por favor! Você não poderia conversar com o Lord das Trevas?

Severus sacudiu a cabeça.

- Isso seria inútil. Eu já tentei. Mas fique calma, Narcissa. - Segurando-lhe a mão, Severus se ergueu e ajudou-a a erguer-se. Conduziu-a até sua cadeira e fez com que sentasse. - Tome seu vinho e se acalme.

Ela se aquietou um pouco e tomou um gole de vinho com mãos trêmulas.

- Talvez eu possa ajudar a Draco - declarou Severus, caminhando pela saleta.

A sra. Malfoy largou o copo e se ergueu novamente, aproximando-se de Severus.

- Oh, Severus! Você estaria disposto a protegê-lo?

- Posso tentar. Eu tenho uma idéia. Mas preciso lhe pedir sigilo absoluto a respeito.

- Claro! Afinal, se é para proteger Draco, é de meu máximo interesse.

- Eu acredito que possa convencer Dumbledore a oferecer proteção a Draco.

- Dumbledore? Mas você não acabou de dizer que era fiel ao Lord das Trevas?

- Exatamente! Eu convenceria Dumbledore a oferecer proteção a Draco. Dessa forma, Draco terá todas as condições para cumprir a tarefa que o Lord das Trevas lhe atribuiu. Entende que... não estaremos nos opondo aos desejos de nosso Mestre?

Os olhos de Narcissa se iluminaram, mas só por um instante.

- Oh, sim. Mas... é muito perigoso, ainda assim.

- Eu estaria sempre ao lado de Draco para protegê-lo.

- Nesse caso... Você faria um Voto Perpétuo?

- Um Voto Perpétuo? Mas estamos só nós dois aqui... Ou você acha que Draco iria concordar?

- Não; eu falo com Draco depois. Eu... Eu posso chamar Bellatrix aqui, para ser nosso Elo.

- Está bem, Narcissa. Se é o que deseja. Mas nossos planos... devem permanecer entre nós, e apenas nós.

Narcissa assentiu com um gesto de cabeça, relaxando. Esboçando um sorriso, pousou as mãos novamente sobre o tórax de Severus.

- Obrigada, Severus. Você é maravilhoso.

Severus afastou-lhe uma mecha de cabelos que lhe tombara diante dos olhos, em um gesto de ternura, e fitou-a.

- Oh, eu já ia me esquecendo. - Severus levou a mão a um bolso interno e retirou a caixinha que Dumbledore lhe dera. - Eu trouxe um presente para você.

- Um presente? - Narcissa segurou a caixinha nas mãos e, com uma expressão de curiosidade, a abriu. - Por Merlin! Que colar magnífico! - Narcissa segurou o colar de diamantes e ficou a admirá-lo. - Oh, entre aqui, Severus. - Narcissa puxou-o pela mão até dentro de seu quarto, onde havia uma penteadeira com um espelho.

- Deixe-me ajudá-la - disse Severus, retirando o colar de pérolas que Narcissa estava usando. - Você tem um porta-jóias?

- Essa caixa de madeira com o entalhe de um basilisco.

Com cuidado, Severus abriu a tampa. A caixa estava cheia de jóias, mas Severus não demorou a localizar o medalhão de Slytherin, pela descrição que Albus lhe fizera. Com mãos ligeiras, guardou o colar de Narcissa e pronunciou um feitiço não-verbal para que o medalhão fosse para dentro de seu bolso. Depois fechou o porta-jóias com a maior calma, pegou o colar de diamantes e passou-o ao redor do pescoço de Narcissa.

Narcissa mirou-se no espelho.

- Que beleza! Você não devia ter...

- É só uma lembrança - disse Severus, com um sorriso galante. Não que ele soubesse exatamente como sorrir de modo galante, mas estava se esforçando ao máximo.

- Muito obrigada mesmo, Severus. Agora... se me permite... vou chamar minha irmã pelo Flu.

- Claro, Narcissa!

Severus respirou aliviado. Pelo menos aquela parte do plano estava dando certo, e ele não precisaria recorrer a métodos mais drásticos, como pingar gotas de poção tranqüilizante no vinho de Narcissa, ou mesmo lançar-lhe algum feitiço.

~*~*~

Em poucos minutos, Bellatrix estava lá, olhando para Severus fixamente com cara de pouquíssimos amigos.

- Vocês não devem desobedecer ao Lord das Trevas.

- Não se preocupe, Bellatrix - disse Severus. - Não faremos nada que vá contra a vontade dele.

Bellatrix continuou fitando-o com olhos desconfiados.

- Bella, por favor... Nós já conversamos sobre isso!

- Tudo bem, Cissy. Eu não confio nele, mas vou fazer isso por você. E quanto a Draco?

- Não se preocupe. Eu vou conversar com ele - disse Narcissa, determinada.

Severus se ajoelhou diante de Narcissa. Queria terminar logo com aquilo. Estava cansado, muito tenso, e a presença de Bellatrix o irritava a um ponto perigoso. Narcissa se ajoelhou também, e eles seguraram as mãos. Bellatrix olhava para eles, atônita.

- E então? - disse Severus, olhando para Bellatrix.

Bellatrix sacou de sua varinha, aproximou-se, e tocou as mãos dos dois com ela.

Narcissa falou:

- Severus, está disposto a proteger meu filho Draco em sua tentativa de cumprir os desejos do Lord das Trevas?

- Estou - respondeu Severus.

Uma língua de fogo saiu da varinha e atingiu as mãos unidas.

- E está disposto a dar o melhor de si para protegê-lo e impedir que seja ferido?

- Estou - respondeu Severus.

Uma segunda língua de fogo saiu da varinha e entrelaçou-se à primeira.

- E... caso se mostre necessário... se parecer que Draco irá falhar... - murmurou Narcissa, fazendo com que Severus estremecesse de leve - ... está disposto a executar a tarefa que o Lord das Trevas incumbiu Draco de executar?

Era exatamente o que Severus temera. Severus teria de destruir tudo o que levara tanto tempo para construir. Severus teria de matar a seu melhor, seu único amigo. Seu mentor. Era horrível demais, mas Severus prometera a Albus, e não podia traí-lo.

- Estou - respondeu Severus.

E uma terceira língua de fogo saiu da varinha de Bellatrix, juntando-se às outras duas e atou como uma corda, como uma cobra de fogo, as mãos unidas de Severus e Narcissa.

~*~*~

Saindo da casa de Narcissa, Severus passou por sua casa em Spinner's End, só para não ir direto a Grimmauld Place. Ali mesmo, extraiu a Horcrux do medalhão. Pelo menos aquela parte de sua missão fora cumprida de modo plenamente satisfatório. De Spinner's End, Severus seguiu para o escritório de Albus.

Albus mostrou-se muito feliz com o relatório de Severus. Segundo ele, tudo saíra como haviam planejado.

- Albus... - Severus nem conseguia expressar seu desespero.

O velho mago aproximou-se dele e o abraçou. Severus estava completamente paralisado pelo horror do que o aguardava.

- Você fez exatamente o que eu lhe pedi. Não se atormente.

O próprio Severus sabia que, se estivesse em seu estado normal, teria muita raiva de seu mentor. Mas não tinha energia sequer para ter raiva.

- Eu não vou matar você. Nunca - disse, por entre os dentes.

- Você é mais importante nessa guerra do que eu. Precisa ter isso claro.

- Não - respondeu Severus, com obstinação.

- De qualquer forma, eu acredito que você nunca precise fazer essa opção. Acredito que a vida de Draco jamais será colocada em risco.

Severus balançou a cabeça, em descrença.

Albus insistiu:

- Não vamos brigar agora a respeito disso. Ainda temos algum tempo. Agora você precisa se preparar para convencer Riddle a usar o jovem Malfoy da forma como planejamos. Vá para casa. Descanse. Não adianta ficar se torturando com isso.

~*~*~

Severus foi para sua casa em Spinner's End. A casa Muggle, herdada de seu pai, só lhe trazia más recordações. As paredes cobertas de velhos livros de capas marrons e negras refletiam seu estado de espírito. Sentou-se no sofá gasto, sem ânimo para nada.

Não queria que Harry tivesse de suportar a mesma agonia pela qual estava passando agora. Não podia ficar perto de Harry. Se ficasse, Harry acabaria ferido.

Severus não conseguia suportar a idéia de que acabara de fazer um voto que o obrigaria a matar seu amigo e mentor. Depois de todos aqueles anos lutando para se redimir, tentando compensar os erros do passado, tentando sufocar o remorso que o torturava, tudo iria por terra.

Severus estava arrasado.

Harry fora algo maravilhoso em sua vida, e por alguns meses ele ousara acreditar que ainda havia uma esperança de futuro para si mesmo. Fora uma loucura. Se ficasse com Harry, iria destruí-lo. Não havia a menor possibilidade de que aquilo fosse dar certo. Severus era um homem marcado, para sempre.

De qualquer forma, havia ainda um segredo que Severus ocultava de Harry, e sabia que, quando esse segredo viesse à tona, a opinião de Harry sobre ele mudaria completamente. Harry saberia exatamente quão baixo Severus havia descido.

Albus insistira em que tudo daria certo, mas Albus não era infalível. Talvez não devesse ter confiado tanto em Albus. Mas se não fosse por Albus, Severus provavelmente teria se matado há muito tempo. Há dezessete anos.

~*~*~

O Lord das Trevas o recebeu no salão da casa que estavam usando como Quartel-General dos Comensais da Morte, nos subúrbios de Londres.

- Que pensamentos tortuosos anda maquinando essa sua mente traiçoeira, Severus? - perguntou-lhe ele, com um sorriso cínico.

- Mestre, eu tenho uma idéia que poderá abrir aos nossos aliados o Quartel-General da Ordem, e possibilitar o assassinato de Dumbledore e, por que não, de Harry Potter.

Sob o brilho interessado dos olhos vermelhos de seu Mestre, Severus expôs seu plano. Uma forte sensação de enjôo o acometeu desde o início, mas em nome de Albus e de Harry, Severus teve forças para ir até o fim.

- Acha, então, que o velho é tolo o bastante para acolher Draco Malfoy em seu Quartel-General.

- Ele tem coração mole e adora dar segundas chances...

- Como fez com você, não é? Mas, Severus, você não acha mesmo que Draco Malfoy tem condições de matar Dumbledore, acha?

- Mestre, se quiser, se ele falhar, eu me sentiria honrado em cumprir essa função.

Severus engoliu em seco para não vomitar. Os lábios do Lord das Trevas se curvaram em um sorriso cheio de prazer.

- Oh, Severus, minha serpente mais traiçoeira... Você o fará, sim, mas só em último caso. Porque a sua presença junto ao velho gagá me é muito útil.

- Como quiser, Mestre.

~*~*~

Severus passou em Grimmauld Place para fazer seu relato a Albus após o encontro com o Lord das Trevas. Albus ficou ainda mais entusiasmado e tentou animá-lo. Disse-lhe que Harry precisava dele, que ele devia voltar à casa de Lupin.

- Você sabe quem eu sou, Albus. Sabe o que fiz e o que terei de fazer. Não sei como pode pensar que Harry precise de mim. Vou voltar a Spinner's End. Não pretendo ver Harry nunca mais.

- Você está cometendo um erro terrível. Não deve tentar quebrar o elo estabelecido entre você e Harry agora. Além disso, vocês quatro vinham trabalhando juntos de forma perfeita!

- Ah, sim. E qual você acha que será a reação deles quando souberem o que fiz no passado e o que terei de fazer no futuro? Mostre a eles aquelas memórias que você tem dentro daquela garrafa. Mostre e verá a reação deles.

Albus ia dizer alguma coisa, mas Severus aparatou em Spinner's End antes que ele pudesse fazê-lo.

Estar em Spinner's End era como estar em um túmulo. E era exatamente onde Severus gostaria de estar naquele momento.

 

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