CAPÍTULO 8 - Natal

 

Nos dois meses que se passaram desde aquela primeira conversa civilizada entre eles, os atentados dos Death Eaters se disseminaram de forma cada vez mais alarmante, devastando Hogsmeade. Famílias tradicionais, de sangue puro, leais a Dumbledore, eram exterminadas, e a Ordem pouco podia fazer - não é fácil se combater táticas de guerrilha. Nesses momentos, o trabalho de espionagem se destacava. Era a única forma de prevenir ataques.

Muitas vezes, após as aulas, Harry ia para o quarto e, se estivesse sozinho, procurava o Professor de Poções no Mapa dos Marauders. À noite, lá estava ele, perambulando por todo o castelo, pelos corredores, pelos salões, pelos jardins. Quando Snape não figurava no mapa - e isso só acontecia a altas horas da noite - Harry se preocupava, imaginando-o ajoelhado diante de Voldemort, recebendo um Cruciatus, ou talvez entre os Death Eaters incendiando casas de Muggles, matando bebês... Às vezes Harry só conseguia dormir quando via o pontinho Severus Snape chegar, finalmente, aos portões de Hogwarts. Então Snape ia direto para seu quarto e não saía mais, e Harry adormecia.

Ceci era uma importante aliada de Harry e sua informante. Sob o olhar mais do que desconfiado de Snape, Ceci lhe contava como havia sido a semana de seu dono, se ele parecia bem ou se algo o incomodava. Harry lhe pedia que prestasse atenção quando o dono chegava muito tarde em casa, para ver se ele estava ferido ou em profunda depressão, e depois lhe contar. Ceci lhe contava que às vezes o dono chegava tarde, com uma expressão terrivelmente cansada e abatida, mas que tomava algumas poções e, no dia seguinte, acordava disposto e cumpria sua rotina.

Snape não o tratava mais com desdém. Às vezes Harry se perguntava se estaria sonhando ou se realmente algum tipo de vínculo começava a se formar entre eles, e não baseado no ódio.

~*~*~

Faltavam poucos dias para o Natal quando Snape e Harry completaram a decifração do código do Manuscrito de Salazar Slytherin. Agora podiam começar a tradução, em si. Harry teria de ir lendo e traduzindo verbalmente; Snape anotaria a tradução ditada por Harry e verificaria possíveis problemas de sentido.

Naquela noite, antes de sair, Harry parou à porta, com um ar indeciso. Snape fitou-o com aquele seu olhar de basilisco.

- Você está usando Legilimência comigo - observou Harry, surpreso.

- Você estava especialmente acessível - replicou Snape.

- Faz isso sempre? Tenta ler minha mente?

O sorriso sarcástico do professor não ocultava uma certa preocupação.

- E você, não faz?

- De que adianta? Você é uma muralha.

- Se fosse tão difícil, você não teria percebido agora que eu estava tentando. É um processo de duas vias. No momento em que eu tento penetrar em sua mente, eu preciso abrir minhas defesas. E aí você pode se insinuar através delas. Foi assim que você percebeu agora.

- Interessante... Bem, conseguiu descobrir o que queria?

- Não - confessou o mago mais velho. - Parece que as suas aulas com o Diretor deram resultado. Talvez por isso ele o tenha liberado das aulas.

- Ele não me liberou, eu que o dispensei.

- Quanta arrogância, sr. Potter!

- Argh, não comece. O que eu queria perguntar é... Er, eu não tenho para onde ir no Natal. Os Dursleys me matariam se eu voltasse para lá. Os Weasleys estão muito ocupados com a Ordem, eu não quero incomodá-los. E Hermione vai viajar com os pais. Então... já falei com a Professora McGonagall... eu vou ficar em Hogwarts. Sendo assim, nós podemos continuar com o trabalho, não é?

- Não seria aconselhável. Não há atividades letivas nesse período e, portanto, não há também aulas de reforço.

Os dois fitaram-se longamente. Harry engoliu em seco.

- O que eu vou fazer durante essas duas semanas? Que tempo mais inútil! Vou morrer de tédio!

- Menino idiota. Vou mandá-lo fazer um ensaio de três rolos de pergaminho sobre os diversos usos da casca do ovo do dragão.

Harry limitou-se a fazer uma careta. Snape fez um gesto de impaciência. Depois de outro silêncio constrangedor, finalmente, falou:

- Você sabe como eu odeio a cerimônia do Natal. Albus sempre fica me provocando, tentando me colocar em situações embaraçosas. Por que você... não vem me ver depois da cerimônia? Com a capa, naturalmente... Eu vou ser mais sádico e desagradável do que nunca. Prometo que você não ficará entediado. E eu poderei me vingar de Albus em cima do seu Garoto de Ouro...

- Você vai ver só, seu patife seboso - respondeu Harry, com um sorriso de orelha a orelha.

~*~*~

Na noite de Natal, Snape ouviu uma batida à porta de seu escritório. Ao abri-la, não viu absolutamente ninguém.

- Você... Entre.

- Feliz Natal! - disse Harry, entrando e estendendo-lhe, ainda por baixo da capa, um embrulho em forma de canudo.

Snape puxou-lhe a capa da cabeça para fuzilá-lo com os olhos.

Harry andou até os fundos do escritório, à direita, onde ficava o canteiro de Ceci, repleto de plantas, galhos e pedras. Saudou-a e passou a mão sobre suas escamas.

- Ceci não está com frio, porque eu coloquei um encantamento no canteiro dela - Snape suspirou. - Venha para perto da lareira.

Harry retornou até o centro do escritório e sentou-se no sofá diante da lareira.

O professor abriu lentamente o pacote, ocultando a curiosidade. Dentro da caixa em forma de canudo, uma tapeçaria, com um brasão em que o Leão se unia à Serpente, com uma torre ao fundo.

- Interessante... É uma imagem do ocultismo que voltou à moda no início do século XIX, com Aleister Crowley. Mas esta gravura parece ser de alguma Ordem mais antiga. Talvez seja interessante investigar sua origem, ahn? Obrigado, Potter.

- Você não pode me chamar de Harry?

- E como você me chamaria?

- De... Severus?

- Mas só quando não houver mais ninguém presente, entendido?

- Severus... - repetiu Harry. - É um nome um tanto pomposo, não? Grave demais.

- Escute, eu não lhe dei autorização para ficar criticando meu nome.

- Não é isso. É que o seu nome é tão solene que tratá-lo pelo primeiro nome não parece ser uma grande conquista em termos de intimidade.

- Menino petulante, sabe quantas pessoas têm autorização para me tratar pelo meu primeiro nome?

- Er, desculpe, já disse que não estou criticando o seu nome, é um nome muito bonito, está bem? É Natal, e eu não vim aqui brigar com você... Severus.

Snape fez um gesto súbito com a cabeça, afastando os cabelos que lhe caíam sobre a face. Então olhou para a parede sobre a lareira, que ficava bem ao centro da parede, e pronunciou o encantamento para fixar a tapeçaria ali.

- Affigo! Ah, sim. E Accio pacote. - Um embrulho surgiu de uma estante e voou até suas mãos. - Também tenho um presente para você.

De queixo caído, Harry apanhou o pacote e o abriu com mãos trêmulas. Era um livro: "O Mergulho em Busca do Pomo Dourado - Estratégias para um Seeker", de... Severus Snape.

- O quê? Você era Seeker e escreveu um livro de Quidditch?

- Nunca foi publicado. Minha vida de Death Eater interrompeu minha brilhante carreira de Seeker e teórico de Quidditch. E nunca tive tempo de retomá-la. Imprimi e encadernei alguns exemplares, numa edição caseira. - Encarou Harry com firmeza. - Infelizmente, não posso desejar que seja útil para você, já que vai usar esses conhecimentos contra minha própria Casa...

- Puxa, obrigado. Isso não foi nada Slytherin da sua parte!

- Ahn, eu sei. Não conte pra ninguém, não deixe que ninguém veja que tem esse livro. Sinto-me, mais uma vez, um traidor.

- E por minha causa, Sev!

Snape ia protestar contra aquele "Sev", mas desistiu. O garoto era incorrigível. Além disso, não queria confessar, nem para si próprio, mas gostava daquela intimidade que estava se estabelecendo entre eles e não tinha mais coragem de lutar contra ela. Não resistiu, contudo, à tentação de provocá-lo:

- Talvez, para compensar, eu faça uns treinamentos extra com minha equipe. Especialmente com Draco - disse Snape, com um sorriso irônico.

Aquela sensação de profunda decepção e vazio, aquilo era ciúmes? Harry não suportava a simples idéia de ver Severus perto do garoto loiro arrogante. Mas o que fazer? Draco era Slytherin, e ele, não. Snape não tirava os olhos de Harry, como se tentasse ler seus pensamentos, analisar as emoções estampadas em seu rosto.

- Queria poder treinar com você, Sev.

- Já pensou a cara que as pessoas iam fazer se vissem essa cena? O Chefe de Slytherin, treinando o Garoto de Ouro dos Gryffindors?

- A cara de McGonagall!

Os dois caíram na gargalhada ao mesmo tempo, e Harry arregalou os olhos. Severus Snape estava rindo.

 

Anterior
Próxima
HOME
Baphomet (Índice)
Fanfiction (Índice das Histórias)