Capítulo II

 

Na manhã seguinte, quando Harry acordou, percebeu que as cordas haviam desaparecido, que havia cobertas sobre seu corpo e que seus óculos estavam cuidadosamente arrumados sobre a mesinha de cabeceira.

Levantou-se, foi ao banheiro e quando voltou ao quarto havia uma bandeja com um café da manhã completo, incluindo ovos mexidos. Harry estava faminto e devorou tudo com apetite.

Depois foi olhar pela janela. O sol já estava alto no horizonte, e os pássaros esvoaçavam entre as árvores animadamente. Ah, se ele pudesse voar um pouco em sua vassoura ou, pelo menos, caminhar por entre as árvores!

Mas Harry era um pássaro numa gaiola, e não tinha a menor idéia do que iria lhe acontecer.

~*~*~

Ao meio-dia, a bandeja com o almoço apareceu sobre sua mesa, substituindo a bandeja vazia do café da manhã. Harry ficou decepcionado; durante toda a manhã, sem ter o que fazer, entediado, esperara o momento em que Snape iria entrar. Preparara-se para xingá-lo, atacá-lo de todas as formas. E agora o desgraçado não aparecia.

O almoço era peixe ao molho de alcaparra, arroz, batatas à dorée e uma salada de alface, pepino e tomate. Não era de se jogar fora.

Mas no meio da tarde Harry não agüentou mais a solidão e o tédio, e começou a esmurrar e socar a porta do quarto.

Snape apareceu em menos de um minuto.

Quando Harry o viu à sua frente, deixou-se cair sentado na cama, prostrado. Snape ficou olhando para ele, sem dizer nada. Parecia preocupado.

- Eu quero sair daqui - choramingou Harry. - Não tem nada pra fazer.

Snape fechou cuidadosamente a porta do quarto e sentou-se na poltrona.

- Há muitas coisas que você pode fazer, na verdade. Mas terá de se comportar.

- O quê é que posso fazer? Dê um exemplo.

- Você pode se preparar para enfrentar o Lord das Trevas.

Harry não conseguia acreditar. Qual era o jogo de Snape?

- E como é que eu vou fazer isso preso aqui?

- Antes de mais nada, você precisa aprender Oclumência. E, para isso, você só precisa controlar a própria mente.

Harry deu uma gargalhada histérica.

- Já passamos por isso antes. Não deu certo.

Snape deu um longo suspiro.

- Pense a respeito.

Snape se levantou e seguiu rumo à porta.

~*~*~

Harry demorou muito a dormir naquela noite, e na manhã seguinte não teve ânimo para sair da cama.

O café da manhã, que já estava sobre a mesa quando ele acordara, ficou lá até a bandeja ser magicamente substituída pela bandeja do almoço. Já devia ser meio-dia. E daí, pensou Harry. Melhor ficar na cama mesmo. Estava se sentindo um pouco enjoado.

A porta se abriu, e Snape entrou.

- O que você tem, Potter? Por que não tomou o café?

- Não estava com vontade - respondeu Harry, virando as costas para Snape.

Snape agarrou-o pelo braço e virou-o para si com violência.

- Fale comigo direito, garoto!

- O que é, Snape? O que você quer? Por que está me mantendo aqui esse tempo todo? Por que Voldemort não vem me matar de uma vez?

- É o que você quer? Morrer?

Harry deu de ombros.

- Melhor do que ficar aqui com você.

A chama do ódio brilhou novamente nos olhos de Snape. Ah, aquilo fazia com que Harry se sentisse melhor. Só quando conseguia irritar Snape àquele ponto ele se sentia vivo.

- A sua companhia também não me agrada nem um pouco - disse Snape, por entre dentes cerrados.

- Ótimo. Então me deixe ir embora e nós dois ficamos satisfeitos.

- Infelizmente isso não é possível. E o senhor está me deixando muito poucas alternativas.

- Mesmo? O que vai fazer?

- Se você não comer, eu vou lhe dar uma surra.

Harry se levantou. Estava tão irritado que sua raiva criou um verdadeiro ciclone, e tudo ao seu redor começou a se espatifar contra as paredes. Harry estava fazendo magia sem varinha, incontrolável.

Snape lançou-lhe um Petrificus Totalus. Paralisado, Harry o viu lançar um Reparo no quarto, depois andar ao redor de Harry, dando uma volta, duas, três antes de anular o feitiço.

Harry estava esgotado e deitou-se na cama.

- O que você quer de mim, afinal?

- Por enquanto, quero que se acalme e se alimente.

Bufando, Harry andou até a mesa, sentou-se à cadeira e começou a comer. Snape sentou-se à poltrona e ficou vigiando-o.

- O que é essa coisa amarela? - perguntou Harry.

- Polenta.

Estava gostoso, e Harry estava mais do que faminto.

- Quem é que faz a comida, você?

- Eu encomendo em um restaurante.

- Tipo assim, um delivery?

- É.

A sobremesa era um creme branco de coco e calda de passas.

- O que é isso?

- Eles chamam de "manjar branco" - Snape respondeu.

- E o que significa isso?

- Literalmente, "delícia branca". É um flan, ou pudim de coco.

- Que língua eles falam?

Snape fez um gesto de impaciência.

- Está fazendo perguntas demais. Termine a sobremesa.

- Você já almoçou? - Harry insistiu em perguntar.

- Não. Estou esperando você acabar.

- Já acabei. Pode ir.

- Eu decido quando vou, e se vou.

Harry deu um suspiro cansado.

- Já comi. O que quer que eu faça agora?

- Que treine Oclumência.

- Por quê? - perguntou Harry.

- O que exatamente está querendo saber? - perguntou Snape, evidentemente irritado.

- Sei lá. - Harry se sentia perdido. - Quero saber tudo. Por que você quer que eu treine Oclumência, por exemplo?

- Não se preocupe com o que eu quero. Eu não sou importante aqui.

Aquilo o surpreendeu. Harry se levantou da cadeira, virou-se para Snape e fitou-o sem entender.

- Você está jogando comigo, não é? É tudo um mind fuck, como eles dizem. Você se sente poderoso, assim? É esse o seu barato? Abusar de pessoas indefesas?

- Não, Potter. Não é esse o meu barato. Mas se é disso que você quer brincar...

Harry ficou vermelho. Snape se levantou e fitou-o, cara a cara, no fundo de seus olhos. Harry o sentiu dentro de sua mente.

- Pare com isso! Como quer que eu resista se eu sequer tenho uma varinha?

- Pirralho estúpido, você não precisa de varinha para bloquear a mente. E, se não consegue, basta fechar os olhos.

Uma nova onda de raiva tomou conta de Harry e, sem encarar Snape, ele se levantou e se jogou contra ele, tentando socá-lo. Snape segurou-lhe os dois braços e conjurou uma corda para prendê-los.

- Vamos ter de passar por isso outra vez? - perguntou Snape, enquanto a corda deslizava pelo corpo de Harry, imobilizando-o.

- Vá embora - gritou Harry, enquanto Snape o deitava sobre a cama. - Deixe-me sozinho!

Snape atendeu a seus pedidos, saindo do quarto. Mas assim que se viu a sós, Harry sentiu-se vazio e derrotado.

~*~*~

Alguém estava segurando seus braços, e estava tudo escuro. Harry tentou dar um chute em seu agressor.

Oh, droga. A realidade atingiu-o com a força de um raio.

- Snape. O que está fazendo aqui?

Snape pareceu ficar embaraçado. Muito estranho. Harry nunca o vira embaraçado.

- Você estava dormindo todo amarrado, de óculos e com a luz acesa.

- Oh. E você veio me desamarrar, me cobrir e me dar um beijinho de boa noite? - Assim que as palavras saíram de sua boca, Harry sentiu-se enrubescer. Por que diabos havia dito aquilo? Mas a reação de Snape foi ainda mais estranha. Os olhos negros se concentraram no rosto de Harry, na região da boca, e ele pareceu ficar sem fala por um instante. Como se... como se quisesse mesmo beijá-lo. Então Snape pareceu acordar do transe, e ficou vermelho. Harry se sentiu ridículo, desajeitado, e não sabia dizer por quê. - Largue-me. Eu tenho nojo de você - ele vociferou, sem conseguir entender por que estava reagindo assim.

Snape o largou de imediato, o ódio chispando em seus olhos.

- Como quiser, sr. Potter. Aliás, o senhor está fedendo. Aqui é uma região tropical. Precisa tomar banho todos os dias.

Em um segundo, Snape havia saído do quarto e fechado a porta, deixando Harry imerso em uma confusão de sentimentos.

 

 

Anterior
Próxima
Nhandu (Índice)
Fanfiction (Índice)
HOME

Reviews

Ptyx, Outubro/ 2005