7 - Confiança
Era mais uma daquelas conversas que, de vez em quando, eles tinham na cama, depois de transarem e dormirem e transarem de novo. Snape o fitou com súbita curiosidade. - Naquele dia, por que você tentou atravessar o véu? Você queria se matar mesmo ou só queria encontrar... - Snape fez uma pausa e soltou o nome por entre os dentes, com a raiva que sempre associava à figura - Black? Harry o encarou com surpresa. Então franziu a testa, parecendo refletir. - Acho que as duas coisas. - Ainda pensa em se matar? - Não. Desde que entrei na mandala... e também quando percebi o que sentia por você... não penso mais nisso. - E sente muita falta de Black? Harry segurou a mão de Severus. - Sinto. Mas não da mesma forma que antes. - Como assim? - Ele... foi a última esperança que tive de ser uma criança feliz. De ter alguém que me protegesse, como criança. Com a morte dele, eu tive de superar o desejo de ter alguém assim. Snape apertou-lhe a mão e, a princípio, ficou em silêncio. Então falou: - Eu lamento que você não tenha tido essa pessoa que o protegesse, uma figura paterna com quem se identificar. E lamento também que você tenha escolhido alguém tão difícil como amante. Sorrindo, Harry afastou-lhe os cabelos do rosto. - Pois é, você me força a amadurecer, porque alguém tem de ser maduro nesse relacionamento - brincou. Snape fuzilou-o com os olhos e rolou para cima dele, esmagando-o. - Como é que é? Peça desculpas. - Ai! Está bem, desculpe. Snape saiu de cima dele e tentou manter certa distância, ficando de lado apoiado sobre o cotovelo, fitando-o com mágoa. Mas Harry acariciou-lhe os braços, a cintura, os quadris, e ele se deixou cair sobre o travesseiro outra vez, mais relaxado. - Na verdade - disse Harry -, você tem se comportado como um amante perfeito. Uma sobrancelha negra se ergueu, e os lábios finos formaram um sorriso orgulhoso. ~*~*~ Em uma outra noite, foi a vez de Harry dizer, de repente: - Eu não consigo acreditar que você torturou mesmo pessoas quando foi Comensal da Morte. Snape ficou branco e sua expressão tornou-se sombria de imediato. - Não quero falar sobre isso. Não traga o meu passado para a nossa cama - declarou, de modo seco. Harry estremeceu. - Tudo bem, Severus. - Não há perdão para o que eu fiz, você entende? Eu deveria ter ido para Azkaban, era o mínimo que deveria ter acontecido. Mas Albus, com aquela sua infinita compaixão, impediu que eu fosse punido. Harry o fitou com um olhar de descrença. - Você acha que ele só queria me usar? - perguntou Snape. - Não é bem assim. Claro que eu fui e sou útil a ele. Ainda bem que é assim. Se eu não pudesse fazer pelo menos isso, já teria me matado. - Não fale assim! Snape prosseguiu como se não o houvesse escutado: - Albus não sabe o que é o Mal. Por isso ele pode perdoar infinitamente. Ele não entende. Se soubesse, não o faria. - Mas ele não é assim tão bom. Ele usa as pessoas. - Isso não tem a ver com bondade ou maldade. Ele faz o que é preciso para atingir seus fins. - Mas isso é Slytherin, não é? Mais calmo, Snape arqueou uma sobrancelha. - Bem observado. - Ele me fez morar com os Dursleys. Eu não sei se consigo entender tanta bondade - disse Harry, com sarcasmo. - Depois, ele sabia que podia confiar em você. - Como você sabe que ele sabia? - Porque sei que ele tem a mesma percepção que eu adquiri na mandala. - Ah, é verdade. Eu tinha me esquecido disso. - E eu confio em você, Severus Snape. Um brilho cristalino surgiu diante dos olhos de ônix. Os longos braços de Snape se estenderam, puxando o corpo esguio do mago mais jovem para si. - Você é completamente louco, Harry Potter. |
Ptyx, Setembro/2004
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