Qualquer Lugar fora deste Mundo

 

Parte I

 

Eu penetro em sua mente sem dificuldade. Você não me oferece resistência. Deveria me zangar e mandá-lo redobrar o esforço, mas sinto-me confortável aqui. Nem mesmo tento ver as imagens. Creio que me distraí, só sentindo as camadas fluindo em ondas, fundindo-se com as minhas próprias ondas. São pensamentos, essas ondas, ou nem isso? Parece que sinto a sua magia, intensa, diferente da minha. O que estou fazendo?

- Potter! Você não pode me deixar ir tão fundo!

Você parece confuso, atordoado. Perdido. Seus olhos aos poucos ganham foco, concentrando-se em meu rosto.

- Isso foi... estranho. Foi... bom.

Sinto um rubor afluir ao meu rosto. Nada disso era para estar acontecendo. Estou perdendo o controle.

- Você deve bloquear a minha invasão, Potter. É para isso que estamos aqui.

- Mas... você fez algo diferente. Em vez de apenas entrar em minha mente, você me entregou parte da sua, não foi? Fundiu seus pensamentos aos meus.

Por mais que isso me irrite, você tem razão. Só que eu não vou admitir isso. Já é ruim o bastante que eu tenha perdido o controle. Deixá-lo saber que perdi, seria a humilhação.

- Isso só aconteceu porque você não me opôs resistência.

Você sacode a cabeça, incrédulo. Tenho vontade de socá-lo. Como ousa me contradizer?

- Legilimens!

Maldição. Eu me distraí. Minha mente é suficientemente treinada para se recompor rapidamente e bloqueá-lo, mas a sua invasão é suave e... doce. Nunca foi assim com Albus. Você passeia em minha mente com a suavidade de uma pluma. Em vez de me sentir violado, eu me sinto preenchido. Você se aproxima, e me toca, pousando a palma das mãos sobre meu tórax, depois me enlaçando com os braços. Eu o envolvo com meus braços, puxando-o contra meu corpo. Minha mente se concentra apenas nas sensações, em nada mais. Creio que você está fazendo o mesmo. Não sei mais quais são as suas sensações e quais são as minhas.

Um ruído quebra a nossa tranqüilidade. É só o vento lá fora; uma tempestade ameaça irromper. Você se afasta, e rompe a ligação mental. Mal consigo me situar. A imagem é ridícula, eu sei, mas é como se eu houvesse sido expulso do paraíso. Um paraíso ao qual não tenho nenhum direito.

- Uau - você diz. - Isso foi... incrível.

"Incrível" é pouco para descrever a sensação. Não sei como descrevê-la, e nem devo. Eu o puxo para mim de novo e meus lábios se esmagam contra os seus como que por vontade própria. Não é um beijo gentil, mas você se agarra a mim com força, e geme. O seu calor se espalha pelo meu corpo. Nossas línguas se encontram em um ritmo sedutor. Quero sugar você como um Dementador. Quero sugar não só a sua alma, não só os seus pensamentos, mas você. Inteiro.

~* ~* ~

Eu me lembro da primeira vez em que senti prazer de matar. Eu era ainda criança. Devia ter uns oito, nove anos. Um corvo entrou em meu quarto. A princípio, tive medo. Depois, raiva. Pássaro estúpido. Como podia se enganar daquela forma? Não ver que ali era perigoso? Ele pousou sobre minha escrivaninha, e eu fiquei furioso. Peguei-o nas mãos e parti-lhe uma asa. Ele guinchou e se debateu. Torci-lhe o pescoço. Mas ele insistia em viver. Então bati a cabeça dele contra a pedra dura da parede do meu quarto, e foi com prazer que vi o sangue escorrer por minhas mãos.

Você me parece tão imprudente quanto aquele corvo, e desperta em mim aquela mesma raiva.

Desde que Albus me acolheu aqui tive de aprender a conter meus impulsos, minha volúpia assassina. Transubstanciei-os em ironia e sarcasmo. Mas você desperta em mim instintos fortes demais para serem contidos dessa forma. Eu nunca soube o que fazer com você. A sua presença me afeta fisicamente.

Não posso quebrar suas asas, torcer seu pescoço ou esmagar sua cabeça contra as pedras. E não consigo humilhá-lo como gostaria. A situação já seria suficientemente frustrante assim. Mas quando você está perto de mim, seu olhar de esmeraldas cravando-se em mim, atravessando-me, seu cheiro almiscarado e adolescente se mesclando ao meu, impregnado de ervas e aromas orgânicos, seu corpo esguio vibrando com uma magia ainda crua mas estonteante, quando você me abraça uma insidiosa felicidade me invade, e você me tem em seu poder.

~* ~* ~

É o fim. Fui despedido. Alguém me viu com você, e contou a Albus. Não devo mais vê-lo. Vou reconstruir minha vida, em algum lugar. Montar um laboratório, vender minhas poções. Albus me pediu para continuar trabalhando para a Ordem. Eu não tenho alternativa. Se abandonar os Comensais sem a proteção de Albus, sou um homem morto. Representarei essa farsa até o fim.

Adeus, Harry.

~* ~* ~

Parte II

 

É você. Eu tenho certeza. Foi você que lançou esse raio prateado com sua varinha. Sinto a sua magia perto de mim. Você sempre me afetou fisicamente. Você está na Floresta. Viro minha Firebolt em sua direção. O sol está se pondo. Espero que ninguém me veja, mas se me virem, que se danem. São eles que precisam de mim agora, não eu deles. O meu destino já está traçado desde sempre.

Outro raio prateado, agora bem próximo.

Escuto meu coração batendo muito forte. Lá está você... de branco. Meu Deus, como você fica bonito de branco, Severus. Se você soubesse!

Eu aponto minha vassoura para baixo e desço a seu lado. Largo minha Firebolt e você já está me agarrando, suas mãos mapeando meu corpo, e eu me comprimindo contra o seu...

- Harry...

O jeito como você diz meu nome é o bastante para me deixar elétrico. Você me comprime contra uma árvore, morde meu pescoço, meu queixo, meus lábios. Eu sinto os músculos de seus ombros, depois desço as mãos pela lateral do seu corpo, parando logo antes dos quadris. Nós... nunca passamos de certos limites. Mas eu quero. Agora, mais do que nunca. Um mês sem vê-lo, e achando que nunca mais o veria!

- Severus... por que demorou tanto?

Você sacode a cabeça, um brilho insano nos olhos. Eu sei. Eu também quase enlouqueci. Eu também achei que não o veria outra vez. Você me agarra e me joga sobre a grama. Um sapo pula para o lado e algumas fadinhas esvoaçam ao redor de nós, incomodadas com a agitação. Mas você nem parece se dar conta de nada. Melhor. É gostoso aqui, sentir o cheiro da grama esmagada e da terra sob nossos corpos, sentir o leve vento passando sobre a pele. Sobre nós, as estrelas, lá em cima, mas... agora só existe nós. É assim que tem de ser.

Você agarra minhas vestes e arranca-as de meu corpo com violência. Deita-se em frente a mim, e desliza as mãos pelas minhas costas. Puxa meus quadris contra os seus. Sinto um calor tão forte em todo o meu corpo. Você me beija, e percorre meu corpo com as mãos.

De repente você pára, tira meus óculos e os deposita sobre a grama, a uma distância segura de nós. Os grilos estão cantando. Você me olha, e a força do seu desejo me incendeia.

- Harry - você murmura, e um arrepio me percorre o corpo. Você me lambe e me beija e me morde, descendo pelo meu corpo. - Você é todo meu. Eu vou deixar minha marca em todo o seu corpo. Em cada pedacinho.

Sim, Severus, me marque. Me faça seu. Você tira minhas cuecas, revelando meu pênis ereto. Eu tento encaixá-lo entre suas coxas, louco de desejo. Você aproxima o rosto devagar e de repente sinto o calor de sua boca envolvê-lo. Mordo os lábios para não gritar.

Você desliza os lábios por toda a extensão, saboreando cada centímetro, separando minhas pernas para ter mais acesso. Eu mergulho meus dedos em seus cabelos e o puxo contra mim com força. Você passa a língua por sobre a pontinha, me fazendo fechar os olhos e gemer de prazer.

De repente você se afasta, e eu abro os olhos. Você tira as vestes em movimentos frenéticos. Tão diferente da sua pose fria a que estou acostumado. Há algo desesperado e insano em seus gestos. O luar bate sobre seu peito. Fico surpreso ao ver como você é bonito. Você abre um frasco e passa um produto incolor e viscoso em seus dedos.

Você se deita de novo sobre mim e captura meus lábios em um beijo rude. Enquanto nossas línguas se entrelaçam, você busca com a mão a fenda entre minhas nádegas. Você roça em meus testículos. Meu corpo se projeta em sua direção. Então você encontra o ponto bem atrás dos testículos, e passa um dedo lentamente ao redor. Esse mesmo dedo desliza para dentro de mim, fazendo meu corpo todo se contrair por um instante.

- Dói.

O seu rosto se contorce, mas o dedo continua se movimentando dentro de mim, entrando e saindo. Meu pênis fica ainda mais rígido.

- Eu sei - você diz, introduzindo mais um dedo.

E eu sei que você não vai dourar a pílula para mim. Você nunca o fez. Se eu quisesse um amante gentil, não estaria aqui. Mas agora seus dedos tocam aquele ponto que dizem ser a fonte do prazer. As estrelas brilham mais forte. Eu quero você dentro de mim, Severus.

Mal seus dedos se afastam, você já está passando o lubrificante sobre seu pênis ereto. Eu o quero dentro de mim, não importa que doa. Você coloca minhas pernas sobre seus ombros. Você parece um deus, postado diante de mim, pronto para me penetrar, uma expressão quase tranqüila agora. Talvez não tranqüila, mas concentrada. Talvez resignada, mas é uma palavra estranha para se pensar em um momento como esse.

Eu também me concentro em me abrir para você, e você penetra, dilacerando-me todo por dentro, com um gemido gutural. Eu me agarro a você, e você me puxa para si.

- Venha. Dói menos se vier a meu encontro.

Eu faço o que você me diz. Sinto que a dor começa a se transmutar em prazer, devagar. Você força as barreiras de minha mente, e eu forço as suas. Não sei mais quem sou, sou apenas uma massa pulsante de desejo e prazer, prazer e desejo.

- Oh, Severus. Mais.

- Harry - você diz, seu rosto refletindo exatamente o que estou sentindo. Não sei como, você consegue ir mais fundo e me tocar exatamente ali, naquele ponto que me faz perder o controle e me torna incapaz de qualquer pensamento coerente. Uma vez, duas, três, e sou lançado em um redemoinho de prazer incontrolável.

Acho que apaguei por alguns segundos. Você está caído sobre mim, arquejando, seu sêmen quente preenchendo-me por dentro. Passo meus braços ao redor de seu corpo e o seguro contra mim.

Você ergue o rosto e me fita com uma expressão preocupada.

- Você está bem?

- Estou.

- Eu não queria que fosse assim, tão violento.

- Foi perfeito. Não se preocupe. Eu sou mais parecido com você do que você pensa.

Você se deita de lado e afasta meus cabelos do rosto.

- Você é estranho, Harry Potter.

Como se eu não soubesse disso.

- Você veio hoje... por alguma razão especial? - eu pergunto, com um mau presságio.

- Aconteça o que acontecer, Harry... Não perca as esperanças, nunca.

Eu me agarro a você com mais força, como se pudesse segurá-lo junto a mim para sempre.

~* ~* ~

Parte III

 

Hoje você matou com uma fúria que eu nunca vi nem nos piores assassinos. Você me surpreendeu.

Você comandava os nossos movendo sua varinha como uma batuta. Escalava muralhas, desviava-se dos feitiços do inimigo, lançava raios fulminantes contra eles. Destruía pontes, derrubando-os no precipício, sem pestanejar.

Várias vezes pensei que você houvesse sido atingido, mas você sempre ressurgia, impávido e implacável, por entre os ossos e esqueletos que se estendiam por quilômetros e quilômetros. Os corvos e abutres já cercavam o campo de batalha, farejando o banquete, mas você era insaciável. Seus raios chicoteavam o inimigo sem dar descanso.

Você voava por entre eles, gritando como uma fera selvagem. Loucos de pavor, eles se precipitavam uns contra os outros, e você os deixava contorcendo-se em dor, amontoando-se uns sobre os outros, seus corpos vertendo sangue, suas vísceras espalhadas pelo solo.

O Lord das Trevas não teve nenhuma chance contra a sua fúria.

Agora acabou. Lutamos nossa última batalha. Estamos ainda no campo de batalha. Ao redor, só cadáveres. Você treme em meus braços, e eu o seguro junto a mim com delicadeza. Sei que você entrará em convulsões durante toda a noite. Já passei por isso várias vezes. É efeito dos feitiços de magia negra. Eu mesmo estou esgotado, mas tento me manter desperto porque sei que você precisará de mim.

Muitos morreram esta noite, de ambos os lados. Confesso que não consigo sentir a perda de ninguém. Tudo o que me importa é você.

- Severus, vamos embora daqui.

- Para onde você quer ir?

- Não importa. Qualquer lugar que não seja aqui. Qualquer lugar fora desse mundo.

Então eu me lembro do único lugar do mundo onde me sinto em paz e uno minha mente à sua. Você relaxa em meus braços e um inacreditável sorriso ilumina seu rosto.

 

FIM

Nota: O título desta fic vem de um poema de Baudelaire, "Any Where Out of the World".

 

Fanfiction (Índice das Histórias)
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Ptyx, Maio/2005