O Corpo Ideal
A batalha terminara. Voldemort fora derrotado, e o campo de batalha estava coalhado de corpos. Os feridos haviam sido levados para São Mungo; os aliados de Voldemort que haviam sobrevivido, para Azkaban. Alguns dos aliados da Ordem da Fênix haviam ido embora para cuidar dos feridos; outros, para celebrar a vitória. Harry, no entanto, quisera permanecer ali, ajoelhado ao lado de um dos corpos, e ninguém conseguira convencê-lo a sair. - Maldito morcego seboso. Eu não sei se você pode me ouvir, mas você não pode me deixar assim. Faz só um mês que descobri que você estava do nosso lado, e só algumas semanas que... você sabe... Você tem alguma idéia de como eu me sinto culpado porque nunca lhe disse o que sentia por você? Não havia ninguém junto a Harry para escutar seu lamento. Ou melhor. Havia sim. Uma pequena serpente cor de ébano aproximou-se dele e enrolou-se em seu braço. Harry a pegou no colo e, de repente, um pressentimento o assaltou. - Eu conheço você? - perguntou à serpente, em Parselíngua. - Suponho que sim, já que você parece estar lamentando a minha morte. O coração de Harry disparou. - M-mas... Como isso é possível? A serpente suspirou. - Seus poderes dedutivos continuam uma nulidade, Potter. - Você... fez um Horcrux pra você mesmo? - Sim. - Com a morte de Dumbledore? A serpente suspirou de novo. - Ele me pediu que o fizesse. Disse-me que, se eu o fizesse com uma boa intenção, minha alma não sofreria danos. Harry olhou, fascinado, para a serpente, tentando absorver a novidade. Acariciou-lhe as costas com a ponta do dedo e a viu estremecer de prazer. - Pensei que, o seu corpo estando inteiro, a sua alma não sairia dele se você tivesse uma Horcrux - raciocinou Harry. - Assim que meu corpo morreu, minha alma saiu dele. Foi horrível. Uma sensação de vazio insuportável. - Por que não entrou de novo no seu próprio corpo? - perguntou Harry. - Porque você estava ao lado dele. Estava esperando você ir embora. Não queria assustá-lo. - Aposto que estava me espionando, isso sim. - De fato, eu fiquei curioso ao vê-lo tão triste com a minha morte. Não esperava tal reação. - Você... vai entrar em seu corpo agora? - Acho que é o melhor que tenho a fazer - disse a serpente. - Se você quiser ir embora... - Não! Eu vou esperar pra ver se dá tudo certo. A cobrinha o encarou com impaciência. - Na verdade, eu não estou certo de que quero voltar para esse corpo, em particular - disse ela, indicando o corpo de Snape com um gesto de cabeça. Harry levou mais do que alguns segundos para entender. - O quê? Mas... Você quer dizer que... - Por que não escolher um corpo mais... adequado? - perguntou Snape. Harry sacudiu a cabeça. - Oh, não. Você não entende que... não seria você? - Você e seus amigos me chamam de "morcego seboso" e outros adjetivos elogiosos como esse. Não pense que eu não escuto. - Eu sei, mas... Olha, eu vi você lutando nas últimas batalhas. O jeito como você se move, a habilidade, a agilidade... Você treinou o seu corpo para isso. Cada parte dele parece se mover perfeitamente ao seu comando. Nenhum outro corpo está mais adaptado ao que você precisa dele. Embora cobras não tenham sobrancelha, a expressão que a serpente fez foi exatamente como se estivesse erguendo uma sobrancelha, e Harry percebeu que se traíra naquela descrição entusiasmada dos dotes físicos de Snape. - Ora, ora... - murmurou a serpente. - Eu morreria com mais freqüência, só para ouvi-lo falar assim do meu corpo! Nesse momento, Harry sentiu um estremecimento percorrer a cobrinha e viu o corpo de Snape se mover diante dele. Snape sentou-se ao chão, ao lado de Harry. Seus olhos se encontraram. A cobrinha deslizou para longe, parecendo assustada. - Satisfeito, agora? - perguntou Snape. Harry assentiu com a cabeça. Snape levantou-se, Harry também. Harry não resistiu à vontade de tocar-lhe o peito. Fingiu estar sentindo-lhe o coração com a palma da mão. Estava louco de vontade de abraçá-lo, mas não tinha coragem. Para o deleite de Harry, Snape fez isso por ele, agarrando-o pela cintura e puxando-o contra si. Harry segurou-o como se não fosse largá-lo nunca mais, e Snape enterrou o rosto na curva de seu pescoço. - Eu pensei que houvesse perdido você para sempre - disse Harry, libertando, enfim, toda a emoção que sentira. Snape roçou o polegar no rosto de Harry, numa suave carícia. Harry suspirou diante daquele toque. Seus lábios se tocaram. Harry emitiu um leve som de aprovação. Os lábios de Snape eram macios e quentes contra os seus. Harry enfiou os dedos por entre os cabelos de Snape e o segurou firme antes de deslizar a língua para dentro da boca de Snape. Foi a vez de Snape gemer, abrindo a boca para que Harry a explorasse com mais liberdade. Quando o beijo terminou, Snape passou um dedo por sobre os lábios de Harry. - Harry - Snape sussurrou. - Você é tão jovem... Gosta mesmo deste velho corpo? - Gosto. Mas talvez eu deva experimentá-lo um pouco mais antes de decidir - disse Harry, com um sorriso travesso, e agarrou Snape para mais um beijo.
~Fim~ |
Ptyx, Outubro - Novembro/ 2006
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